O dilema do crescimento econômico e a insatisfação popular no Brasil

Após um leve crescimento do PIB de 1,4% no primeiro trimestre de 2023 e um desemprego reduzido aos níveis mais baixos desde 2012, a insatisfação popular em relação ao governo de Lula é, no mínimo, intrigante. Um estudo recente indicou que 57% da população rejeita a administração atual. Esse cenário expõe um paradoxo que desafia a lógica econômica e política do país.

Causas da insatisfação: mais do que ideologia

O fenômeno da rejeição ao governo não se relaciona apenas a questões ideológicas ou políticas tradicionais. O que se observa é uma “fatiga comunicacional” de Lula, que tem dificuldade em cativar a população. Mesmo entre aqueles que o apoiaram nas eleições de 2022, muitos se sentem insatisfeitos e indecisos sobre sua escolha futura em 2026.

Um dos pontos-chave que explicam essa insatisfação é a falta de uma narrativa clara que ofereça uma perspectiva de futuro. O presidente tem lutado para convencer a população de que há um caminho positivo adiante, o que é essencial para a manutenção da confiança pública.

O novo cenário do emprego

Outro aspecto relevante na equação é a crescente desvalorização do trabalho formal. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que historicamente foi vista como uma proteção para os trabalhadores, agora enfrenta um crescente desprezo entre os mais jovens. Para muitos, o custo de vida atual não compensa os baixos salários oferecidos. Como resultado, muitos optam por trabalhos informais, realizando “bicos” e se desmembrarem em múltiplas atividades para garantir uma renda.

Essa mudança de mentalidade está criando um novo perfil de trabalhador autônomo e empreendedor. Com a propagação da cultura digital e as promessas de sucesso rápido, muitos jovens desejam ser “donos do seu tempo”, mas a realidade muitas vezes é dura e cheia de desafios. Embora a ideia de empreender seja atraente, a transição de um emprego formal para um trabalho independente é cheia de obstáculos e incertezas.

Quem escuta os novos empreendedores?

A pesquisa qualitativa realizada pelo Plaza Pública destaca que, atualmente, faltam representantes políticos que dialoguem com este novo perfil de trabalhadores. Esses jovens se sentem à margem da política tradicional e buscam uma voz que compreenda suas lutas diárias e desafios específicos. Eles querem ouvir propostas concretas, planos e uma visão que se alinhe com seus valores e aspirações.

Esse público, por mais que tenha um orçamento de classe média baixa, possui sonhos que transcendem sua realidade financeira. Há um desejo comum de adquirir bens, viajar e oferecer qualidade de vida. No entanto, as narrativas políticas atuais frequentemente não atingem esse tipo de eleitor, focando mais em promessas que não refletem suas realidades e anseios.

A lacuna da comunicação política

Em um momento em que o Brasil precisa urgentemente de um diálogo aberto e sincero, a falta de conexão da política com a realidade dos novos trabalhadores é preocupante. As promessas de crescimento econômico, como a “picanha” popularizada em discursos políticos, são insuficientes. As pessoas buscam narrativas que façam sentido no contexto da vida urbana contemporânea, que levem em conta as complexidades de seu dia a dia.

O cenário brasileiro pede um rethink das prioridades políticas e sociais, começando pela capacidade de escuta e comunicação eficaz entre governantes e cidadãos. Portanto, para que o governo melhore sua imagem e recupere a confiança da população, é preciso construir uma narrativa mais inclusiva e que reine a esperança de um futuro melhor.

Ainda que o Brasil tenha alcançado melhores números em indicadores econômicos, o desafio maior é conectar esses dados a uma política que realmente fale a língua da população, que compreenda suas angústias e busque corresponder às suas expectativas. Somente assim será possível reverter essa rejeição e plantar as sementes de um futuro verdadeiramente promissor.

*Mestre em Análise da Opinião Pública e psicólogo, trabalha com pesquisa qualitativa há mais de 30 anos. É diretor do Projeto Plaza Pública, barômetro que mede qualitativamente a agenda do país de maneira periódica.

Com informações do Jornal Diário do Povo

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