Por que a classe média brasileira enfrenta maior perda de poder de compra

Mesmo com a melhora na renda da população, a classe média brasileira tem enfrentado dificuldades para manter seu padrão de vida. Especialistas apontam que fatores como alta carga tributária, inflação persistente e defasagem na tabela do Imposto de Renda contribuem para esse cenário, que reflete o desafio de preservar o poder de compra no país.

Composição da renda e impactos na carga tributária

De acordo com estudos do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco), a maior parte da renda da classe média é composta por rendimentos tributáveis, diferentemente das classes mais altas, que recebem uma parte significativa de ganhos isentos, como lucros de capital. Assim, famílias da classe média acabam pagando mais impostos proporcionalmente à sua renda.

O levantamento revelou que trabalhadores com salário entre R$ 1 e R$ 2 mil têm apenas 10,7% de sua renda isenta de impostos, enquanto quem recebe acima de R$ 240 mil mensais possui 71% da renda livre de tributação. Essa maior incidência de tributação na classe média resulta em uma alíquota efetiva maior, agravando o achatamento de sua renda na comparação com as elites.

A defasagem na tabela do Imposto de Renda e suas consequências

Outro fator que agrava a situação é a não atualização da tabela do Imposto de Renda, que permanece defasada em relação à inflação e ao crescimento da renda média do brasileiro. Como consequência, cada vez mais pessoas são obrigadas a pagar alíquotas mais altas, mesmo com rendimentos modestos.

Para o próximo ano, está prevista a entrada em vigor de uma isenção para quem ganha acima de R$ 5 mil, uma medida enviada pelo governo e aprovada pelo Congresso no fim de 2025. Apesar disso, a defasagem histórica na atualização da tabela continua a elevar a carga tributária de segmentos médios da população.

Tratamento desigual e incentivo à pejotização

Profissionais com mesma faixa de renda enfrentam tratamento tributário distinto, o que amplia a desigualdade. Trabalhadores que recebem R$ 10 mil, por exemplo, pagam alíquota efetiva de cerca de 15%, enquanto dividendos recebidos por pequenos empresários — na mesma faixa de renda — podem ter alíquota zero, devido à pejotização.

Esse cenário incentiva a substituição de contratos de trabalho formais por contratação como pessoa jurídica, deixando de pagar encargos trabalhistas e menor tributação sobre lucros e dividendos, o que reforça a desigualdade fiscal no país.

Tributação sobre consumo e desigualdade entre classes

Além da carga tributária sobre a renda, a classe média e famílias de baixa renda destinam uma parcela significativa do orçamento a impostos indiretos, como ICMS e contribuições sociais. Segundo o advogado tributarista Marcus Vinícius Nunes Morais, estudos indicam que famílias que ganham até um salário mínimo (R$ 1.518) têm aproximadamente 50% da renda comprometida por tributos.

Já famílias com renda de até 50 salários mínimos — cerca de R$ 75.900 — dedicam pouco mais de um quarto de sua renda a impostos. Essa concentração de tributos sobre consumo penaliza as camadas mais pobres, agravando as desigualdades sociais.

Perspectivas da reforma tributária e desafios futuros

Após décadas de discussão, a reforma tributária foi aprovada no fim de 2023, com previsão de implementação em etapas até 2033. A primeira fase, que trata da regulamentação dos impostos sobre bens e serviços, avançou em julho deste ano. No entanto, a segunda etapa, que envolve a tributação de renda, ainda está em debate, enfrentando resistência política especialmente com as eleições de 2026.

Especialistas apontam que, embora a reforma avance em direções importantes, ela ainda não resolve completamente as distorções do sistema tributário. Viviana Santiago, da Oxfam Brasil, destaca que o país continua a tributar mais sobre consumo do que sobre renda, penalizando as classes mais pobres e dificultando uma distribuição mais justa das receitas públicas.

O que esperar para o futuro da carga tributária no Brasil

Mesmo com a aprovação de medidas como a restrição de isenção para quem ganha até R$ 5 mil, o impacto financeiro dessa isenção — estimado em R$ 25 bilhões — evidencia os desafios fiscais que o país enfrenta para promover justiça social e tributária. A expectativa é que o debate continue a evoluir, mas o avanço efetivo dependerá de avanços políticos que podem ser prejudicados pelo calendário eleitoral.

O técnico do Ipea, Sergio Gobetti, alerta que a discussão sobre justiça fiscal ainda está longe de ser concluída e que a implementação de novas medidas dependerá de um clima político mais favorável, o que nem sempre ocorre em anos de eleições ou de incerteza econômica.

Para entender melhor os fatores que aprofundam o desafio da tributação no Brasil, acesse a matéria completa no g1.

Com informações do Jornal Diário do Povo

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