Diretor do Fed sugere ‘terceiro mandato’ e preocupa mercados

O novo diretor do Federal Reserve (Fed), Stephen Miran, gerou surpresa e preocupação entre investidores ao mencionar, em depoimento ao Congresso, a ideia de um “terceiro mandato” para o banco central dos EUA. A declaração reacendeu debates sobre a autonomia do Fed e a influência do governo na política monetária, especialmente em um contexto de tensões com o governo de Donald Trump, que busca pressionar o órgão a reduzir as taxas de juros.

O ‘mandato triplo’ e suas implicações para o Fed

Nos EUA, o Fed tem tradicionalmente um mandato duplo: buscar a estabilidade de preços e o máximo de emprego. Contudo, Miran sugeriu a necessidade de um “mandato triplo”, incluindo o objetivo de manter taxas de juros de longo prazo moderadas. Essa ideia é uma reinterpretação de trechos do estatuto do banco central, pouco utilizados na prática, mas que, na visão de analistas como Andrew Brenner, podem permitir maior influência do governo na política monetária.

Reações do mercado e críticas à tentativa de controle

Veteranos de Wall Street como Brenner entenderam a fala de Miran como um sinal de que o governo pode estar disposto a usar a política monetária de forma mais ativa para manipular os rendimentos dos títulos de longo prazo, o que poderia comprometer a independência do Fed. “Não é algo imediato, mas certamente é algo a se considerar”, afirma Brenner, vice-presidente da Natalliance Securities.

Além disso, há preocupações sobre o impacto dessa estratégia na inflação e na estabilidade financeira, especialmente se o Fed começar a intervir de forma mais agressiva, vendendo papéis de curto prazo e recomprando títulos de longo prazo para segurar as taxas, como sugerem alguns operadores de mercado.

O passado e o possível retorno às intervenções

Historicamente, o Fed já adotou medidas similares em momentos de crise, como durante a Segunda Guerra Mundial e após a crise de 2008, com operações conhecidas como “Operação Twist” e compras em larga escala de títulos. No entanto, especialistas alertam que, atualmente, esses métodos poderiam ser considerados como tentativas de interferência política com riscos de efeitos adversos, especialmente em um cenário de inflação persistente.

O professor Gary Richardson explica que, ao contrário de épocas de guerra ou crise, o atual momento não justifica esse tipo de intervenção, e que o uso de cláusulas no estatuto do Fed para exercer controle mais forte sobre os juros longos poderia ser uma postura arriscada. “Não estamos em guerra, nem em uma grande depressão. Agora, é simplesmente Trump querendo fazer isso”, avalia ele.

Perspectivas e consequências potenciais

Especialistas também debatem até que ponto o conceito de “taxas de longo prazo moderadas” é razoável, uma vez que os dados históricos mostram que os rendimentos atuais estão próximos de suas médias de décadas, o que indicaria que não há necessidade de medidas extraordinárias. Contudo, a ambiguidade do termo permite interpretações variadas, o que pode gerar volatilidade no mercado financeiro.

Se o Fed abrir precedentes para controlar esses juros de forma sistemática, há o risco de distorções no mercado de títulos e efeitos inflacionários futuros, além de prejudicar a credibilidade da independência do órgão. Como aponta Mark Spindel, a definição de “moderada” é vaga, e a intervenção excessiva pode se voltar contra os próprios interesses do governo.

Implicações para o cenário global e os déficits americanos

Ao manipular as taxas de longo prazo, o governo americano busca evitar a elevação do custo da dívida pública, que já ultrapassa US$ 37 trilhões. Com a expansão dos déficits fiscais, esse tipo de intervenção se torna uma estratégia frequente, mesmo que contrarie normas tradicionais de autonomia do Fed, como explica Vineer Bhansali, fundador da LongTail Alpha.

Apesar de essas ações carregarem riscos de inflação descontrolada e instabilidade, o governo parece disposto a assumir esses riscos para manter os custos de financiamento sob controle e estimular a economia. “No final, o Fed terá de fazer o que o presidente e as autoridades fiscais quiserem, dane-se a inflação”, afirma Bhansali.

Mais detalhes e repercussões podem surgir nas próximas semanas, à medida que o Fed se prepara para suas reuniões e novas declarações de seus integrantes.

Leia mais em O Globo.

Com informações do Jornal Diário do Povo

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