Apps de IA criam imagens realísticas de viagens inexistentes

Nos últimos meses, apps que utilizam inteligência artificial para criar imagens realísticas de destinos turísticos que nunca foram visitados estão em alta, especialmente nas redes sociais. Basta navegar pelo feed para encontrar fotos de pessoas em lugares icônicos, como a Torre Eiffel, praias do Caribe ou castelos da Disney, tudo gerado artificialmente sem qualquer registro real.

O fenômeno dos “clones digitais” e as novas tendências

Startups do Vale do Silício, como as que criam réplicas de sites para treinar agentes de IA, têm desenvolvido ferramentas que possibilitam a criação de fotos de férias perfeitas de forma rápida e acessível. Uma dessas plataformas, o Endless Summer, lançado recentemente no Apple Store pelo designer Laurent Del Rey, permite que usuários enviem uma selfie, escolham um cenário e recebam imagens em segundos, pagando um valor que varia de R$ 29,90 a R$ 299,90.

Segundo Del Rey, o uso do app é mais lúdico do que enganoso, e muitos usuários admitiriam a origem artificial das fotos caso alguém questione. A facilidade de gerar imagens de lugares exóticos ou momentos de relaxamento alimenta comunidades nas redes sociais, como grupos no Facebook e perfis no Instagram, onde usuários compartilham prompts utilizados e resultados obtidos.

Manipulação de imagens e as novas possibilidades de escapismo

Ferramentas como o Gemini AI, do Google, criam fotos hiperrealistas de “férias perfeitas” a partir de selfies, envolvendo o usuário em cenários de sonho, viagens imaginadas e até ensaios de aniversários que nunca aconteceram. Essa tendência atende ao desejo de escapar da rotina, especialmente em tempos de burnout ou ansiedade, reforçando a ideia de experiências virtuais como uma extensão da vida real.

Ferramenta Nano Banana Pro, do Google, cria fotos hiper­realistas de 'férias perfeitas' em poucos segundos. Imagem simulada pelo GLOBO — Foto: Reprodução/Gemini AI
Ferramenta Nano Banana Pro, do Google, gera fotos hiper­realistas de férias em segundos. Imagens simuladas pelo GLOBO — Foto: Reprodução/Gemini AI

Aplicativos também oferecem recursos para montar ensaios fotográficos corporativos, experiências pessoais ou viagens fictícias, usando comandos textuais detalhados, o que facilita a criação de imagens altamente convincentes. A popularidade dessas plataformas revela uma busca crescente por experiências virtuais imersivas, embora nem sempre claramente rotuladas.

Impactos sociais, éticos e regulatórios

Segundo o antropólogo David Nemer, essas criações dizem mais sobre a cultura digital contemporânea do que sobre “falsidade”. A imagem gerada pela IA funciona como um símbolo de status ou narrativa pessoal, reforçando a lógica do valor social na exibição digital, independentemente da autenticidade.

Entretanto, especialistas alertam para os riscos éticos e legais. Ronaldo Lemos, do ITS Rio, destaca a necessidade de criar padrões de transparência e rastreabilidade, como a implementação de metadados verificáveis, para evitar fraudes e assegurar a origem das imagens.

Desafios para autenticação e confiança

Com a evolução dos modelos de IA, sinais de manipulação tendem a ficar mais difíceis de identificar, aumentando a preocupação com a credibilidade das informações visuais. A presença de marcas d’água, falhas visuais ou transições estranhas ajuda na detecção, mas esses indícios podem desaparecer com o avanço tecnológico.

Ferramenta Nano Banana Pro, do Google, cria fotos hiper­realistas de 'férias perfeitas' em poucos segundos. Imagem simulada pelo GLOBO — Foto: Reprodução/Gemini AI
Ferramenta Nano Banana Pro, do Google, cria fotos hiper­reais de férias em poucos segundos, com marca d’água automática.

Já há uma discussão em curso sobre o uso de padrões de transparência, com propostas como os padrões C2PA, que incluem metadados verificáveis sobre a origem e o histórico das imagens digitais. Essas iniciativas são essenciais para mitigar os riscos de manipulação indevida e garantir a confiança na era da imagem sintetizada.

Consequências econômicas e culturais

O uso massivo de imagens geradas por IA ameaça a relação de marcas e consumidores. Profissionais alertam que a manipulação sem critérios claros pode diminuir a confiança em identidades pessoais e marcas, além de reforçar uma cultura de consumo aspiracional baseada em falsas aparências.

Para o pesquisador José Carlos Rodrigues, o envolvimento com a IA impacta também questões de memória, autoestima e justiça social, uma vez que as imagens podem criar uma realidade simulada que fragiliza a noção de autenticidade.

Especialistas reforçam ainda que, além de riscos legais e de privacidade, o uso de imagens sintéticas pode expor usuários a fraudes, clonagem de identidade e deepfakes, especialmente quando suas fotos pessoais são utilizadas sem rastreabilidade ou consentimento.

O fenômeno evidencia uma transformação profunda no conceito de autoimagem digital, indicando uma sociedade que caminha para uma era pós-fotográfica, na qual a fronteira entre real e artificial fica cada vez mais tênue, afetando política, memória, relações sociais e a própria autoestima.

Para entender melhor esse cenário, acesse o artigo completo no site do Globo.

Com informações do Jornal Diário do Povo

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