Integrar Amazônia e Cerrado na COP30 é estratégia essencial para o clima
A menos de três anos para a realização da COP30, especialistas argumentam que a crise climática exige uma visão integrada entre os biomas brasileiros, especialmente a Amazônia e o Cerrado. Sem essa integração, aponta o estudo, o Brasil perde uma oportunidade única de liderar uma transição energética e social sustentável, capaz de promover prosperidade de longo prazo.
A relação direta entre Amazônia e Cerrado na mudança climática
De acordo com pesquisadores, o Cerrado e a Amazônia formam um contínuo ecológico, cuja transição geográfica não obedece às fronteiras traçadas nos mapas políticos. Os processos de mudança no uso da terra, o aumento do desmatamento e a exploração de recursos, principalmente no Cerrado, impactam diretamente a saúde da Amazônia, reforçando a necessidade de políticas integradas.
Um exemplo fundamental dessa conexão está na circulação de “rios voadores”, massas de ar que transportam umidade do Equador até os trópicos, influenciando o regime de chuvas na região Centro-Oeste e no Norte do Brasil. “A evapotranspiração amazônica alimenta esses mecanismos, e o desmatamento enfraquece esse ciclo, prejudicando toda a região”, explica Laerte Ferreira, doutor em Ciência do Solo pela Universidade Federal de Goiás (UFG).
Desafios ambientais, econômicos e políticos
Pressão na ocupação do Cerrado e o risco de um modelo insustentável
Atualmente, o Cerrado enfrenta o maior índice de desmatamento entre os biomas brasileiros, com cerca de 652 mil hectares em 2024. São áreas sob forte pressão de agronegócio e lobby de setores econômicos que estimulam a expansão da soja e da pecuária, muitas vezes à custa da biodiversidade e do equilíbrio hídrico.
Dados recentes revelam que a agricultura no Cerrado já invade áreas vulneráveis, muitas delas fora de unidades de conservação e reservas legais, double impacto que aumenta o risco de perda de estoques de carbono e agravamento das mudanças climáticas.
Impactos das mudanças climáticas na agricultura e na biodiversidade
O aquecimento do Cerrado é preocupante. Entre 1981 e 2020, a temperatura média cresceu 0,024°C ao ano, enquanto a precipitação despencou 1,72 mm/ano, intensificando a aridez e prejudicando a agricultura, com atrasos nas plantações e redução na produção.
Um estudo do Lapig e da ONG The Nature Conservancy estima que há aproximadamente 103 milhões de hectares de vegetação nativa remanescente no Cerrado, dos quais 32 milhões estão totalmente vulneráveis. Esses territórios guardam um estoque de carbono de 1,64 gigatoneladas — uma oportunidade de preservação que, se perdida, aumenta a emissão de gases do efeito estufa.
Propostas para uma estratégia nacional inovadora
Para reverter esse cenário, os especialistas defendem a criação do Instituto Nacional do Cerrado (INC), uma entidade vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que atuaria como centro de excelência na formulação de políticas, pesquisa e inovação para o bioma.
A iniciativa não é apenas ambiental, mas uma estratégia de Estado para potencializar a sociobiodiversidade, estimular o desenvolvimento sustentável e criar mecanismos de incentivo compatíveis com a preservação, como o Programa Cerrado em Pé, que remunera ações de preservação ou recuperação de reservas legais.
Construindo uma agenda integrada na COP30
Segundo os autores do estudo, a próxima conferência da ONU sobre clima deve ultrapassar a visão de uma “COP da Amazônia” e construir uma agenda Amazônia–Cerrado, que contemple a recuperação de pastagens, o controle do desmatamento, o uso de créditos de carbono e o pagamento por serviços ambientais.
Para isso, é fundamental colocar cientistas, produtores rurais, povos indígenas e comunidades tradicionais na mesa de decisão, garantindo uma governança participativa e baseada em evidências científicas. Além de promover instrumentos como o Plano ABC+ e o Programa de Conversão de Pastagens, a integração desses biomas deve ser uma prioridade da política nacional.
Perspectivas futuras e o papel do Brasil no cenário global
Consolidar essa visão na COP30 é uma oportunidade de o Brasil liderar uma transição justa, que alie desenvolvimento econômico, proteção ambiental e justiça social. A criação do INC, por sua vez, será um catalisador para transformar o conhecimento científico em ações concretas, consolidando uma estratégia de longo prazo.
Ao integrar Amazônia e Cerrado, o Brasil não apenas protege sua biodiversidade e sua capacidade de regular o clima, mas também potencializa sua liderança no cenário internacional em defesa de uma economia verde e inclusiva.
Com isso, a próxima COP pode marcar um momento decisivo na história do enfrentamento às mudanças climáticas, colocando o Brasil na vanguarda de soluções integradas e inovadoras.
Com informações do Jornal Diário do Povo
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