Juros reais elevados: remédio ou veneno para a economia brasileira?
Em nota divulgada na última quinta-feira, o IBGE informou que houve uma leve deflação de 0,11% em agosto. Apesar dessa indicação de menor pressão inflacionária, o Brasil consolidou uma das maiores taxas de juros reais do mundo, aproximando-se de 10% ao ano, o que gera preocupação. A Selic atualmente está em 15%, enquanto a inflação de 4,95% (IPCA acumulado em 12 meses) reflete um quadro desafiador para a economia nacional.
Por que os juros altos no Brasil parecem excessivos?
De acordo com o Banco Central Europeu (BCE) e estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI), taxas reais de juros acima de 3% já são consideradas elevadas. Países com níveis de inflação semelhantes aos do Brasil praticam juros reais entre 3% e 4%. Uma Selic real de 5% ao ano já seria suficiente para lidar com questões fiscais e conter pressões inflacionárias, segundo especialistas.
Qual o problema de uma taxa tão elevada?
Autoridades e analistas questionam: por que o Brasil necessita de uma overdose de quase 10% em juros reais? Apesar de o país ter historicamente adotado taxas elevadas, os efeitos colaterais dessa política vão além da remuneração de investidores em títulos de renda fixa. O primeiro impacto é sobre o investimento produtivo, que precisa oferecer retornos superiores a 9% reais para se justificar — patamar difícil de alcançar, o que desestimula a formação de capital fixo.
Consequências para famílias e empresas
Diante de juros elevados, famílias e empresas enfrentam crédito caro, spreads bancários elevados e excesso de comprometimento de renda. Isso reduz a demanda, esfria o mercado de trabalho e limita o crescimento econômico. Segundo dados do Banco Central, mais de 71 milhões de brasileiros estão inadimplentes, enquanto quase um terço das empresas têm dívidas em atraso, refletindo os efeitos paralisantes da política de juros elevada.
Impactos fiscais e estruturais
Do ponto de vista fiscal, juros altos aumentam o custo da dívida pública, com cada ponto percentual adicional na Selic acarretando cerca de R$ 60 bilhões a mais no gasto anual do Tesouro. Isso provoca um ciclo vicioso de ampliação da dívida e aumento do risco de substituição por títulos de maior custo. Embora o tamanho da dívida (78% do PIB) seja inferior ao de várias economias avançadas, sua dinâmica de crescimento tem potencial de se tornar insustentável.
Repercussões distributivas e cambiais
Além disso, juros altos transferem renda do conjunto da sociedade para os detentores de títulos, favorecendo famílias de maior renda e o sistema financeiro. Também valorizam o real, prejudicando exportadores e reduzindo a competitividade externa do Brasil. No longo prazo, essa política reforça um padrão de alocação de poupança que privilegia o setor público em detrimento do setor produtivo.
O dilema do Brasil: juros que criam outros problemas
Para muitos especialistas, o principal problema não é a necessidade de juros positivos em certos períodos, mas aceitar uma dose cavalar de juros reais que agrava diversas outras questões da economia. A combinação de disciplina fiscal, reformas estruturais e expectativas ancoradas é fundamental, mas, na prática, anos de políticas com altos juros têm mantido o país preso a um ciclo de overdose monetária.
Perspectivas para o futuro
Se nada for mudado, o Brasil continuará enfrentando os efeitos deletérios dessa estratégia, que prejudica o crescimento, aumenta a desigualdade e fragiliza o cenário fiscal. Segundo especialistas, é urgente desenvolver uma abordagem mais ampla e estrutural, pois a diferença entre o remédio e o veneno está na dose. Como bem lembra uma análise recente (Fonte), a excessiva obsessão por juros altos pode estar mais para veneno do que para remédio em nossa economia.
Com informações do Jornal Diário do Povo
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